Acredite: esse é o Hospital das Clínicas de Pernambuco

Por Mirella Marques

Um hospital que já foi referência em infraestrutura e prestação de serviço no passado agora enfrenta graves problemas de manutenção. Entre eles goteiras em cima da camas dos doentes, falta de água e sabão nos banheiros, chuveiros com larvas de mosquitos, buracos no teto, sujeira, elevadores que quebram com frequência e ausência de lugares para acompanhantes nas enfermarias. Essa é a situação do Hospital das Clínicas (HC), vinculado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e única unidade federal de saúde no estado. Depois de receber a denúncia de um acompanhante, a equipe do Diario passou um dia registrando o sofrimento dos pacientes e seus parentes e a angústia dos funcionários que trabalham no hospital.

Os buracos no teto são cartão de visitas do HC. Presentes em todos os andares. Quando chove, os quartos das enfermarias ficam cheios de goteiras. Algumas, inclusive, em cima das camas dos doentes. "Os corredores ficam todos alagados", garantiu a tia de uma jovem internada que passou uma noite de pânico e horror no mês passado. Quando não chove, o problema é outro: o calor. Não existe ar-condicionado nas enfermarias, apenas nos blocos cirúrgicos e nas salas de atendimento. Resta apelar para os janelões. Os acompanhantes usam papelões como cortinas. À noite, esses mesmos papelões servem de "cama", já que não existem acomodações para eles. Aí, mais um drama: ou tentam dormir em cadeiras, algumas quebradas, ou dividem a cama com o próprio paciente. "Isso aumenta o risco de infecção hospitalar e é muito difícil fiscalizar todo mundo", adverte uma enfermeira. Eles também reclamam da iluminação fraca nos corredores e quartos, o que acaba atrapalhando na hora de aplicar soros e injeções ou colher material para exames.

 A falta de água é outro agravante. Há dias em que os banheiros ficam sem água durante duas horas. Em banheiros do 9º andar, há larvas no chuveiro. Quando isso acontece, são colocadas toucas de cabelo para "filtrar" a sujeira. Também há reclamações de falta de material de escritório. Em alguns departamentos, os servidores estão fazendo brechós para comprar papéis, pranchetas e até beliches para a sala de permanência dos técnicos de enfermagem.

A maternidade, que funciona no quarto andar, é um dos setores onde há mais reclamações. "Minha cunhada teve bebê aqui e eu tomei um susto. O hospital é muito sujo", comentou a estudante Juliete Ribeiro, 22 anos. Ao saber que a filha e o neto receberiam alta, uma avó chorou copiosamente. "À noite, os mosquitos ficam em cima dos bebês. A comida e as instalações são péssimas. Chorei por um desabafo. Estamos saindo desse pesadelo", afirmou a mulher. O Diario flagrou uma abelha no banho de luz usado pelos bebês com icterícia.

A presidente do Cremepe, Helena Carneiro Leão, ficou impressionada com os relatos e garantiu que uma equipe de fiscalização vai verificar as denúncias. Segundo a presidente, nada do que foi descrito pela reportagem deveria acontecer em um ambiente de saúde. "Nós já sabíamos que havia uma superlotação de pacientes, principalmente na maternidade e nas UTIs. Mas é impossível dar um plantão de qualidade sem água. A falta d'água atrapalha a higiene dos procedimentos. Nunca ouvi nada parecido nos últimos três anos em Pernambuco", afirmou Helena.

 

"Todo dia falta água no banheiro"

"Embora o atendimento dado pelas enfermeiras e pelos médicos seja bom, aqui é muito ruim para a gente. Minhas coisas ficam no chão. Não tem lugar. Durmo numa cadeira de plástico. No banheiro, falta água todos os dias. Sem falar no calor. Para o sol não bater no meu marido, fiz uma cortina improvisada com papelão. Também não dá para comer a comida do refeitório. Não vejo a hora de sair daqui" 


 

"Tudo aqui é muito sujo"

"É um absurdo um hospital como esse ficar nessa situação. Há três anos, vim aqui para acompanhar minha irmã mais velha e o cenário era outro. Agora, mal temos onde passar a noite. Todos os trincos das enfermarias estão quebrados. Sem falar nos elevadores, que travam com frequência. Sei que o HC é um hospital com bons médicos mas tudo é muito sujo e os corredores fedem. Essa é a verdade"


"À noite não tem iluminação"


"Estou internada por causa de um câncer no colo do útero, há 22 dias. A internação tem falhas. Uma delas é a falta de iluminação à noite. Mal dá para ver as enfermeiras. Estou aguardando para fazer um exame de ressonância magnética, que vai determinar como vou fazer o tratamento. Os médicos vão decidir se me opero ou faço quimioterapia. Estou esperando porque não existe exame de ressonância no HC"


IMPORTÂNCIA HISTÓRICA

O Hospital das Clínicas (HC) foi fundado em 14 de setembro de 1979. A data marca o início da transferência da unidade hospitalar do então Hospital Pedro II, ao lado do IMIP, para a edificação localizada no campus da Cidade Universitária, onde o hospital funciona hoje. Na verdade, as obras começaram na década de 1950 mas, por causa de problemas, só foram concluídas no final da década de 1970.

O HC foi criado para apoiar o ensino de graduação e pós-graduação do Centro de Ciências da Saúde, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O hospital-escola ainda é um dos principais centros de saúde da região e oferece atendimento altamente especializado. Para funcionar, o HC recebe recursos do governo federal, por meio dos ministérios da Saúde e da Educação.

Apesar dos problemas enfrentados hoje, não se pode negar a importância histórica dos hospital universitário. "O Hospital das Clínicas é uma instituição com 32 anos de prestação de serviço à população de Pernambuco, formando e especializando médicos de todo o estado. Profissionais que se tornaram referência nacional em suas áreas", afirmou o secretário de Saúde do estado, Antônio Carlos Figueira.

Ele também citou a relevância das pesquisas científicas desenvolvidas na unidade de saúde, além da oferta de consultas e cirurgias especializadas para os pacientes da rede pública ao longo de três décadas. "A Secretaria Estadual de Saúde vai apoiar a implantação de um serviço de emergência 24h no HC, contribuindo com o Serviço Único de Saúde (SUS)", comentou o secretário.

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