Não somos os melhores em tudo

Por Ricardo Braga

Somos seres humanos filogeneticamente evoluídos, claramente situados na extremidade do ramo mais alto da enorme árvore evolutiva, que nos reconhece como espécie de máxima evolução entre os viventes e os que já viveram. Só para pensar nos últimos quinhentos anos de história e filosofia, pode-se afirmar que, desde o racionalismo de Decartes, passando pelo iluminismo de Spinoza, o positivismo de Comte, até as correntes mais contemporâneas do raciocínio e da metodologia científica, somos considerados em geral como os melhores entre as espécies que habitam este planeta.

Somos bons na criatividade para encontrar soluções, na literatura, nos esportes, em contar piada (pelo menos rimos de nós mesmos) e, infelizmente, também na guerra.

Mas, precisamos reconhecer, não somos melhores em tudo. Aliás, muitas vezes somos inteiramente incompetentes. É fácil identificar situações - nos níveis micro, meso e macro - em que outros seres vivos dão um olé no desempenho humano e muitas vezes ganham por WO simplesmente por ser impossível ao homem se colocar em posição comparativa, ao não possuir habilidade para certos desempenhos específicos.

Desde que nascemos, inalamos ar da atmosfera, captando dele o oxigênio fundamental para o nosso metabolismo de seres aeróbicos. De troco, nossas células descartam o excesso de gás carbônico produzido, exalado na respiração.

E quem produz o O2 indispensável e absorve o excesso de CO2 na biosfera? As plantas terrestres e as algas, sobretudo as oceânicas, que pela fotossíntese fazem o que nós, animais, nunca fizemos.

Com o nosso cérebro criativo bem oxigenado, fomos capazes de imitar os pássaros e criar aparelhos de posicionamento espacial, navegando tecnologicamente entre continentes, com grande precisão. O que não fomos capazes é de, sem aparelhos, voar e ter um posicionamento geodésico, como fazem as aves migratórias, naturalmente.

E, para perdermos a arrogância, lembro que dependemos de uma certa bactéria, que muitos consideram injustamente como o horror da saúde pública: o coliforme fecal. Isso mesmo, a minúscula Escherichia coli, que habita o intestino de todos os seres humanos, produz a vitamina B12, responsável pela manutenção do sistema nervoso e contribuinte na formação do sangue.

Por isso, podemos considerá-la implicitamente nossa amiga, por disponibilizar o que não conseguimos sintetizar no próprio organismo. Para completar, ela é usada pelos sanitaristas como indicadora biológica de poluição por esgotos domésticos por refletirem a existência de reais parasitas intestinais.

Que fique claro para os que imaginam o homem independente da natureza. Podemos até sermos os melhores em muita coisa, mas não somos em tudo. Mais: não somos capazes de preencher todas as funções que garantem a nossa própria existência no planeta. Ou seja, somos parte de um todo ecossistêmico, compartilhando funções e dependendo mutuamente para permanecermos vivos.

Sendo assim, como não amar e defender seres tão especiais? Nessa lógica, o respeito e o cuidado que devemos ter por eles se equiparam ou transcendem aos que dispensamos à própria família.

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