Por Vinícius Sobreira
Símbolo da difusão artística em Pernambuco, o cinema São Luiz, no centro do Recife, está sendo boicotado pela distribuidora do filme "Gonzaga de pai para filho". As redes de cinemas multiplex se sentiram ameaçadas pelos preços populares do maior e mais antigo cinema do estado e pressionaram a distribuidora.
O São Luiz estava entre as salas de cinema que exibiriam o filme na estreia nacional, na última sexta-feira (26). A casa já havia recebido a pré-estreia do filme no último dia 10 de outubro, com casa cheia, diretor, produtores e elenco. Mas, mesmo com um acordo verbal, a distribuidora Downtown Filmes acabou negando ao São Luiz o direito de reproduzir o longa.
Os 992 lugares e o preço de R$ 4,00 a inteira e R$ 2,00 a meia entrada assustou a concorrência, que logo se articulou para pressionar a Downtown Filmes, que acabou desistindo, já que os demais exibidores do Recife têm aproximadamente 300 salas no Norte/Nordeste do país, enquanto o Governo de Pernambuco tem uma única sala. E o São Luiz só vai receber o filme no final de novembro, quando o filme já estiver "frio".
Acontece que o Governo do Estado, preterido na exibição, investiu R$ 540 mil no filme, por meio da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe). Dinheiro público. Mas o interesse público, de assistir ao filme por um valor mais acessível, acabou ficando em segundo plano em nome dos interesses comerciais.
De acordo com o programador do São Luiz, Geraldo Pinho, apesar da reestruturação, o São Luiz continua sendo considerado um cinema de segunda linha, que só consegue exibir filmes que já foram exibidos na cidade.
"O cinema brasileiro é sustentado com dinheiro público, do contribuinte. Mas depois que o filme está pronto, é do mercado, regido pelas leis do mercado. Cinema público como o São Luiz não é valorizado. As distribuidoras sempre acabam cedendo à pressão do mercado", reclama Geraldo Pinho.
"Um filme que, segundo as expectativas, vai ser sucesso de bilheteria, como esse de Gonzaga, a gente não consegue. Eles [as distribuidoras] alegam que nós não temos contas para pagar, porque o cinema é sustentado pelo contribuinte."
O programador qualificou a situação como "vexatória", relembrando que ouviu da própria Downtown Filmes que colocar ingressos a dois reais era algo "desleal". Pior para o público, que nos fins de semana chega a pagar R$ 25,00 para assistir a um filme.
Em contato com a Downtown Filmes, a reportagem ouviu a mesma coisa. "O filme não pode ser passado ao São Luiz por conta da concorrência. Nós teríamos problemas com os exibidores do multiplex, como a UCI e Severiano Ribeiro", respondeu a empresa.
No filme, que relembra a vida do músico popular com base na sua relação com o seu filho, "Gonzaguinha", músico também falecido, tem uma cena emblemática. Luiz Gonzaga - contratado para tocar num cine-teatro - se nega a fazê-lo, porque havia muita gente do lado de fora que não conseguiu ingresso para o show. O Rei do Baião subiu na marquise do teatro e tocou de graça para o público na rua. "Se o povo está querendo ver meu show, eu farei o meu show para o povo".
Fundado em 1952, o São Luiz - então nas mãos do grupo Severiano Ribeiro - fechou as portas em 2007, sucateado. No ano seguinte, o prédio foi tombado e o cinema comprado pelo Governo do Estado, que revitalizou a casa preservando o formato de cine-teatro. Há relatos de que Luiz Gonzaga frequentava.
A Secult-Fundarpe enviou nota para amenizando o fato de que o longa não está sendo exibido no São Luiz.
"Haverá, sim, exibição deste filme no São Luiz, mas apenas a partir da terceira semana de sua estreia em outras salas do Recife. O cinema São Luiz não poderia abrigar o filme Gonzaga, neste momento, em sua grade de programação, inclusive por estar passando por obras de manutenção, preventivas e corretivas. Além de garantir o filme na grade do São Luiz, daqui a mais alguns dias, a produção do filme ofereceu contrapartidas ao Governo do Estado de Pernambuco, como a exibição gratuita do filme a jovens de escolas públicas.
Nunca houve um acordo oficial para que o filme ocupasse a grade do cinema São Luiz desde sua estreia; o que houve foi sua pré-estreia lá, motivo de felicidade para o Governo do Estado e Secretaria de Cultura, pois havia até uma pequena "disputa" para que a primeira exibição do longa acontecesse em outras capitais do país.
Para o Governo do Estado, o apoio ao filme Gonzaga, de pai para filho é parte de um reconhecimento da importância deste grande artista no cenário cultural nacional e internacional, no ano em que, se vivo fosse, Gonzaga completaria 100 anos. O filme ultrapassará os limites do estado, as fronteiras do Brasil, e fortelecerá o legado de Luiz Gonzaga, o "pernambucano do século" e um dos maiores nomes da cultura brasileira."
Fotos: Edmar Melo
