CASO SERRAMBI : Resumo do primeiro dia de julgamento


Texto: Daniel Guedes/JC Online; vídeo: Inês Calado/JC Online e fotos: Alexandre Gondim e Guga Matos/JC Imagem

A tarde deste primeiro dia de julgamento do Caso Serrambi, nesta segunda-feira (30), foi conturbada no Fórum de Ipojuca, na Região Metropolitana do Recife. O tribunal foi palco de bate-boca entre defesa e acusação, expulsão de uma advogada e xingamento por parte de uma testemunha. A sessão que começou às 15h30 terminou quase às 20h, com uma acareação entre o pai de Maria Eduarda Dourado, Antônio Dourado, e uma das testemunhas o defensor público José Francisco Nunes.





Foto: JC Imagem

CLÁUDIO JOVENTINO - O primeiro depoimento da tarde foi o do delegado da Polícia Federal Cláudio Joventino (foto acima), que durou cerca de uma hora e meia. Joventino foi o último delegado a investigar o homicídio das amigas Maria Eduarda e Tarsila Gusmão, ocorrido em 2003. Joventino afirmou que investigou várias pessoas "sem justa causa" a pedido do então promotor de Ipojuca, Miguel Sales. "Havia uma intenção deliberada de tumultuar o inquérito. Até hoje ele não aceita essa tese (de que as jovens foram mortas pelos kombeiros)".



Sales foi o principal alvo do depoimento de Joventino. "O promotor não admitia qualquer prova que incriminasse os kombeiros. Todos os indícios que indicavam os kombeiros (como responsáveis pelo homicídio) eram rechaçados pelo promotor. O Ministério Público estava trabalhando de mãos dadas com a defensoria dos kombeiros", afirmou o delegado. O policial federal indicou que havia por parte de Miguel Sales uma "predisposição" em incriminar os amigos das garotas que estavam numa festa da qual elas participaram no fim de semana do crime. O delegado explicou que foram feitas diligências e escutas telefônicas que afastaram a possibilidade que virou história recorrente na internet: que uma meninas morreu de overdose e a outra foi alvo de queima de arquivo. "Com certeza, aqueles amigos de Maria Eduarda não estupraram nem executaram Tarsila e Eduarda. Tenho 100% de certeza", garantiu a testemunha.



Joventino disse ainda que, por diversas vezes, Regivânia Maria da Silva, testemunha chave que diz ter visto as meninas entrarem na kombi dos irmãos Marcelo e Valfrido Lira, foi assediada para mudar seu depoimento. "Regivânia foi constrangida e seduzida a mudar seu depoimento", disse sem citar nomes.



Durante o julgamento, a defesa dos irmãos kombeiros Valfrido e Marcelo Lira chamou a atenção para o fato de que a perícia dos fios de cabelo encontrados na kombi não foi conclusiva. O delegado admitiu tal fato, mas apontou ter outras provas, como perícias e depoimentos.



O momento tenso do depoimento, no entanto, ficou por conta da advogada pernambucana que atua no Ceará Maria Consuelo Bezerra Lins, convidada pelos advogados para a assessoria de defesa. A juíza Andréa Calado Venâncio ordenou que a advogada fosse retirada do tribunal por tentar falar diretamente aos jurados. Ela acusou o delegado de incriminar um jovem em Fortaleza em processo semelhante ao das estudantes Maria Eduarda Dourado e Tarsila Gusmão, que representa uma verdadeira briga de classes sociais.



Segundo Consuelo, Joventino conduziu o inquérito que incriminou um rapaz chamado Elionildo, em Fortaleza (CE), que teria estuprado e matado uma jovem vestibulanda em novembro de 2000. Segundo Maria Consuelo, as provas colhidas apresentam fraudes para proteger os verdadeiros culpados. A mulher se dirigiu aos jurados dizendo "eu quero recomendar aos jurados..." e foi repreendida pela juíza, sendo retirada da sala.



ABENÇOADO - O segundo depoimento da tarde foi o primeiro da defesa. Às 17h15 começou a falar o kombeiro Paulo Feliciano Diniz, o Abençoado. Num depoimento de apenas 15 minutos, a testemunha se contradisse. Primeiro afirmou que no dia 3 de maio de 2003, data do crime, passou pela padaria Porto Pão, onde deixou três passageiras carregadas com sacolas. O local foi onde Tarsila e Eduarda teriam subido na kombi de Marcelo e Valfrido. "Não vi os meninos rodando por aquele lado", informou Diniz.



Em seguida, a acusação questionou se o kombeiro lembrava o que tinha feito nos dia anterior e nos posteriores ao crime. Abençoado afirmou que lembrava ter transportado alguns passageiros, mas não soube dar nomes. Depois, ainda sob questionamento da promotoria, a testemunha disse não lembrar o dia em que conduziu as três mulheres de que falou no início do depoimento.



Foto: JC Imagem

DEFENSOR PÚBLICO - O último e mais agitado depoimento deste primeiro dia foi o do defensor público José Francisco Nunes (foto acima), que defendeu os acusados de maio de 2003 a novembro de 2008. Nunes afirmou que, a princípio, Miguel Sales acreditava na culpabilidade dos kombeiros. Somente depois ele teria mudado de opinião. "Após o promotor receber o inquérito policial ele se convenceu de que a autoria (do crime) não estava provada".



O clima esquentou quando o promotor Ricardo Lapenda disse que o defensor público afirmou, em conversa informal, que acreditava que Marcelo era culpado e Valfrido, inocente. "O senhor é um mentioroso!", gritou Nunes para Lapenda. Acusação e defesa começaram a bater boca, o que levou a juíza a interromper a sessão por 45 minutos.



Alegando a possível ocorrência de um crime de falso testemunho, o promotor solicitou a convocação do professor Carlos Roberto da Silva que, segundo Lapenda, testemunhou a conversa. "Uma vez que fui chamado de mentiroso, é necessário que o Conselho de Sentença escute a testemunha". A juíza, no entanto, indeferiu o pedido. "(A convocação da testemunha) tem relevância para o caso, mas deveria ser feita em momento oportuno", concluiu Andréa Calado.



Uma visita à casa do promotor Miguel Sales também rendeu polêmica. Em depoimento à Polícia Federal, em 27 de janeiro de 2006, Antônio Dourado afirmou que tanto Sales quanto José Nunes saíram em defesa dos kombeiros dizendo "que aqueles kombeiros, coitadinhos, não tinham culpa de nada". Em seu testemunho, Nunes confirmou que disse isso - exceto a palavra 'coitadinho' -, mas afirmou não saber se Sales havia concordado. A acusação, então, pediu a acareação dos dois, que confirmaram seus depoimentos.


Foto: JC Imagem

Os trabalhos terminaram pouco antes das 20h. Os kombeiros voltaram escoltados para o Cotel, em Abreu e Lima, onde estão presos. Os sete jurados foram levados a um hotel no município que não teve o nome revelado. Eles dormem lá até o final do julgamento. Os quatro homens e três mulheres ficam incomunicáveis, sem acesso a jornal, rádio, internet, televisão e telefone.



MIGUEL SALES - Em entrevista após a sessão, o promotor falou sobre os depoimentos em que foi citado. Em relação ao encontro em sua casa entre ele, Antônio Dourado, José Nunes e um advogado de Dourado, Sales disse que foi procurado pelo pai de Maria Eduarda para mostrar o resultado de uma investigação contratada pela família. "Antônio Dourado me ligou e disse ter contratado uma investigação e informou que ia me levar. Isso foi depois de devolver o inquérito. Dr. Nunes, às vezes, ia lá em casa. Foi uma coincidência ele ir neste mesmo dia". Sales negou que tenha feito as declarações apontadas pelo pai de Maria Eduarda e disse não saber se o defensor público disse ou não alguma coisa.

O promotor também rebateu as críticas feitas pelo delegado Cláudio Joventino. "O delegado comete um grande equívoco. É de uma pobreza jurídica insustentável. Se todos os requerimentos que fiz foram deferidos pela juíza é porque tinham procedência".



A sessão desta terça-feira (31) está marcada para começar às 9h. Oito testemunhas de defesa devem ser ouvidas.

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