CRÔNICA: A BARBA DO PRESIDENTE LULA E OS BICHOS QUE LÁ SE ENCONTRAM


Lembro-me que quando pequeno minha avó, já falecida, sempre chamava a nossa atenção quando notava alguém de barba. Primeiro que representava para ela homens comunistas, avessos à religião e, também, achava uma falta de higiene. Aos poucos, com nossa evolução e o entendimento das coisas mundanas fui chegando à conclusão que o certo não estava naquela opinião, mas o respeito a ela dada nunca foi deixado de lado.

Passei admirar aos senhores barbados quando descobri que a do Papai Noel não era de verdade. Foi quando o velho Nicolau desceu em um campo aqui da cidade em um helicóptero e lá fui e arranquei sua barba de mentira enquanto o velho dava presentes a outras crianças. Depois desse feito só acreditava nos homens que tinham a barba de verdade. Foi assim que me encantei com o Jacobitar, que foi prefeito de Campinas, mas dele o encanto provinha do bigode. Não bastou para que depois de um tempo me impressionasse com o “Lula”, nosso atual presidente da República, na época torneiro mecânico (um grande homem) envolvido com os sindicatos e a luta pelas “Diretas Já!”. O primeiro olhar foi para sua barba, aquela não podia ser de mentira, aquele homem falava a verdade e não era como Papai Noel que enganava as criancinhas e as devorava (pedofilia?). Suas palavras envolvidas pela veracidade de sua barba acabaram me levando a acreditar no Partido dos Trabalhadores (PT) e de lá vi outros barbudos manifestando toda a sua inteligência, planos que poderiam retirar nosso País do buraco.

Briguei argumentando na escola quando disseram, em 1994, que a barba do Lula deveria ser retirada em nome da estética do Brasil, pois um homem que almejava ser o nosso Governador Maior não poderia se portar como um mendigo. Quanto preconceito. Parti para cima dos agressores que, também, não se calaram e chamaram-me de apreciador de analfabeto. Lula não ganhou essa, também, não se desfez de sua barba inteligente e continuou a deixá-la crescer como fazia sua popularidade. Aumentava como o comprimento de sua barba em sua face cada vez mais envelhecida. Passou 1998 e lá estava Lula novamente, agora com a barba um pouco mais aparada, já se fazia por merecer um personal stylist, eu não concordava, mas a mídia desejava. Não ganhou essa, pois Fernando Henrique falou difícil, inventou o Real e a moeda prosperou.

Veio 2002 e neste ano ninguém levaria, pois Lula era o cara (ainda é segundo Barack Obama). A barba tornou-se muito menor do que nos tempos de brigas pela liberdade, mas tudo em nome da vitória que há vinte anos o político ex-barbudo perseguia. Até alianças com os seus piores e temidos inimigos ele fez, acharíamos que ele não se desfaria de sua barba? Quase um imberbe. Ganhou, sua barba foi reduzida e as amizades aumentaram, assim como os seus problemas.

O cabelo foi cada vez mais chamando pelo branco, o seu discurso foi ganhando desculpas, algumas mentiras e lá na barba, rala, como a minha avó nos dizia se concentram os bichos, representantes da podridão de nossa política, escondem-se ali: José Sarney, Fernando Collor de Mello, Renan Calheiros; outros estão mais embaixo, preparando para subir e encontrar um pouco de ar para respirar como o deputado Palloci, José Genuíno e o muito escondido José Dirceu. Enfim a barba do Lula que era grande como a sua honra, sua verdade, diminui e ganhou peças-chave nesse processo de desestruturação da política brasileira. È a falta de vergonha. Ou o nosso Presidente aproveita-se e deixa sua cútis imberbe ou apela para o retorno à barba dos tempos da criação de grandes homens, como ele foi.

Texto: Sérgio Sant'Anna, Professor de Língua Portuguesa e Literatura, Escritor.

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