Por Renato Lima, especial para o Blog de Jamildo
Postagem Gabriel Diniz
Causa surpresa a passividade da sociedade brasileira diante da atual eleição.
Questões de princípios, como o uso do Estado e toda a sua estrutura para manter um partido no poder, são tratadas como coisas menores, que deveriam nem ser alvo de discussões políticas e, quando o são, criticam a oposição.
Principalmente o governo federal e o caudilho Lula não medem esforços para eleger um cheque em branco e se manter no poder.
Agendas “administrativas” são criadas apenas para mobilizar a estrutura de governo para comícios. Nem obedecem o texto da lei (daí tantas multas) e muito menos ao espírito da lei, que prevê a limitação do abuso de poder econômico de quem já domina a máquina pública.
Nas ruas, bandeiras hasteadas por militância paga e santinhos com led light. Espontaneidade e engajamento zero.
Mas essa letargia pode ter uma causa mais profunda do que o silêncio da dita “sociedade civil organizada”, que hoje fica claro que muitas serviram até aqui apenas de braço de influência e propagação gramsciana da hegemonia do partido no poder.
Daí a total falta de importância e ausência no debate político sobre os rumos do País de entidades como OAB, ABI entre outras.
O estado de desânimo da atual eleição (e aí adiciono que com vários petistas com os quais conversei nenhum disse que votaria em Dilma por convicção e admiração, mas pela conveniência e porque Lula mandou) talvez tenha raízes mais profundas, estruturais em vez de conjunturais.
É a vontade de ser dominado pelo messias, da busca da autocracia em vez de instituições impessoais, meritocráticas e cegas ao personalismo.
Sem boas instituições não se alcança desempenho econômico favorável de longo prazo nem democracia sustentável, como nos lembra Douglas North.
Sobre isso recordo esse trecho de Freyre, analisando características da Casa Grande e seu transbordamento ao campo político:
“Mas esse sadismo de senhor e o correspondente masoquismo de escravo, excedendo a esfera da vida sexual e doméstica, têm-se feito sentir através da nossa formação, em campo mais largo: social e político. Cremos surpreendê-los em nossa vida política, onde o mandonismo tem sempre encontrado vítimas em quem exercer-se com requintes às vezes sádicos; certas vezes deixando até nostalgias logo transformadas em cultos cívicos, como o do chamado marechal-de-ferro. A nossa tradição revolucionária, liberal, demagógica, é antes aparente e limitada a focos de fácil profilaxia política: no íntimo, o que o grosso do que se pode chamar “povo brasileiro” ainda goza é a pressão sobre ele de um governo másculo e corajosamente autocrático. Mesmo em sinceras expressões individuais – não de todo invulgares nesta espécie de Rússia americana que é o Brasil – de mística revolucionária, de messianismo, de identificação do redentor com a massa a redimir pelo sacrifício de vida ou de liberdade pessoal o laivo ou o resíduo masoquista: menos a vontade de reformar ou corrigir determinados vícios de organização política ou econômica que o puro gosto de sofrer, de ser vítima, ou de sacrificar-se.” (Gilberto Freyre, Casa Grande & Senzala, pg 52, 34ª edição).
Gostaria que Gilberto Freyre estivesse errado, mas análise não pode ser confundida com torcida.
Já se vão mais de 70 anos da publicação de Casa Grande & Senzala e se mostraram como messias figuras tão diferentes como Getúlio, Sarney no auge do Plano Cruzado, Collor e Lula.
Mas todos, exceto a presidência de Lula, tiveram oposição que podia ser fraca nas urnas mas forte na propagação, debate e respeito de ideias.
Agora, além de dominarem a máquina, a hegemonia petista impõe uma narrativa de superioridade moral ainda que pegos na corrupção, no aparelhamento, na confecção de dossiês e partem para o ataque àqueles que denunciam, seja político da oposição, seja imprensa.
O que antes se fazia envergonhado, agora tentam envergonhar quem aponta o que se faz de errado.
Dossiê e uso da máquina praticava também um Antônio Carlos Magalhães, mas que sempre foi conhecido como um coronel do atraso com mando em determinado Estado e tratado como algo que certamente seria exterminado da política brasileira, mais dia menos dia.
Agora, a prática carlista está instaurada em Brasília e cresce pela apatia da falta de participação popular e silêncio da “sociedade civil organizada”.
É a cultura do mandonismo, que estimula ascensão dos messias como identificava Freyre, com algo novo e não menos ruim para a cultura política do País: a hegemonia petista.